Os desafios no controle da mastite contagiosa
A mastite é responsável por grandes prejuízos na atividade leiteira, tendo como o principal impacto a diminuição da produção de leite. Segundo Gonçalves et al (2018) uma vaca com contagem de células somáticas (CCS) de um milhão de células por mL de leite apresenta perda de produtividade de até 10% em virtude do quadro inflamatório. Outro prejuízo se dá pela penalização aplicada pelo laticínio ao produtor, em virtude da elevada CCS no leite do tanque. Pode-se listar ainda, descarte de animais, perda de quarto mamário, descarte de leite e custos com tratamentos, entre outros. A mastite pode ser classificada de acordo com sua etiologia em ambiental ou contagiosa e a predominância de um comportamento classifica o patógeno em um dos grupos (Zadocks e Schukken, 2003). É uma classificação que, apesar de subjetiva, é bastante didática para o entendimento da doença, além de auxiliar nas condutas de tratamento, controle e prevenção. A figura abaixo ilustra que os clássicos agentes contagiosos, tais como Streptococcus agalactiae e Staphylococcus aureus, possuem predominância de comportamento contagioso com discreto comportamento ambiental. Fonte: adaptado de Zadocks e Schukken, 2003. Um patógeno é classificado como contagioso por ser adaptado à glândula mamária, sendo esta seu nicho de predileção e assim o quarto mamário infectado passa a excretar o agente patogênico juntamente com o leite. No momento da ordenha, o leite que permanece na superfície da teteira, caneca de teste, tapete, mão do ordenhador, toalha, entre outros fômites está repleto do microrganismo. A exposição de um quarto mamário sadio à essas fontes de infecção facilita o contágio. O sucesso da infecção depende da capacidade de invasão do agente na glândula mamária bem como do seu tempo de viabilidade. O quarto infectado pode apresentar mastite na forma clínica (MC) ou subclínica (MSC). Os agentes contagiosos geralmente estão relacionados à MSC, com potencial de quadros clínicos intercalados. Sendo assim, o principal reflexo das infecções contagiosas está na elevação da CCS. Além do Streptococcus agalactiae e Staphylococcus aureus já mencionados como patógenos ambientais, inclui-se o Mycoplasma bovis e o Corynebacterium bovis. Segundo Krishnamoorthy et al. (2021) a MSC possui prevalência mundial estimada em 42%, enquanto para MC a prevalência estimada é de 15%. No Brasil, Busanello et al. (2017) estudaram medidas de ocorrência de MSC em 517 rebanhos de três regiões. Os autores reportaram prevalência de 46,4%, incidência de 0,17% novos casos por vaca/mês, além de observarem tendência de aumento desses índices ao longo dos anos, independentemente da região e tamanho do rebanho. O diagnóstico da mastite é baseado em duas vertentes: identificação da inflamação e do agente causador do quadro. A contagem eletrônica de células somáticas no leite e o California Mastitis Test (CMT) identificam a ocorrência de processo inflamatório, uma vez que este é o principal fator de aumento das células no leite. São testes mais simples e de baixo custo e, por essa razão, são usados como rotina nos programas de triagem da MSC. Já a cultura microbiológica é o exame usual com boa acurácia para a maioria dos patógenos, porém demanda estrutura laboratorial e execução por mão de obra especializada. Os métodos de biologia molecular, como PCR e MALDI-TOF, são mais modernos e de maior custo, além de demandarem equipamentos específicos. O controle dos agentes contagiosos nos rebanhos leiteiros é focado no potencial de transmissão, mas a possibilidade de o agente estar presente também fora da glândula mamária deve ser considerada, pois esses microrganismos podem sobreviver em biofilmes, colonizar outros tecidos, causar outras patologias e até infectar outras espécies animais. Sabendo-se que o equipamento de ordenha e demais fômites são as principais fontes de contaminação para as vacas sadias, as medidas de prevenção devem ser direcionadas a estes materiais. Assim é fundamental a implementação da linha de ordenha, a qual consiste em ordenhar primeiramente animais mais sadios ou com menor possibilidade de estarem infectados para reduzir o risco de transmissão dos agentes contagiosos durante a ordenha. Na prática a ordenha deve seguir a seguinte sequência: primíparas, multíparas em início de lactação, multíparas em final de lactação e lote de vacas em tratamento, para que sejam ordenhadas ao final os animais infectados. Outra possibilidade usual é a divisão de lotes segundo a CCS individual, com a ordenha iniciando por aqueles de menor CCS e finalizando pelos animais de elevada CCS. Em propriedades com o objetivo de controlar e erradicar agentes contagiosos, a segregação dos animais positivos para S. aureus e M. bovis deve ser a primeira opção a se considerar. Frente ao S. agalactiae a blitz terapia é o recomendado e ao C. bovis a terapia de secagem ao final da lactação. É fundamental o monitoramento contínuo dos agentes etiológicos das MC e MSC, ainda que um referido microrganismo tenha sido erradicado deve-se sempre considerar a possibilidade de ressurgimento desse ou até o aparecimento de um agente jamais antes isolado. A rotina adequada de ordenha é fundamental na prevenção, por meio dos procedimentos bem realizados e na sequência ideal. Normalmente o indicado se baseia em pré dipping, teste da caneca de fundo escuro (triagem da mastite clínica), secagem dos tetos, acoplamento de teteiras, ordenha e pós dipping. Na etapa de secagem dos tetos recomenda-se um papel toalha descartável por teto, com a finalidade de não carrear patógenos de um teto para outro, e a execução imediata da aplicação do pós dipping logo após a extração do conjunto de ordenha, desinfectando o teto de agentes adquiridos pelo contato direto com a teteira. A manutenção e higienização do equipamento de ordenha é de igual importância na prevenção da mastite. A formação de biofilmes viabiliza a sobrevivência dos patógenos no equipamento, que são parcialmente liberados pelo fluxo de leite. Pressão de vácuo e pulsação não compatíveis com o sistema de ordenha, levam à sobre ordenha ou excesso de leite residual que consequentemente deixam a glândula mamária mais susceptível ao desenvolvimento de mastite. Uma vez o patógeno dentro da glândula mamária, a chance para que ele não cause um quadro de mastite, depende da capacidade do sistema imunológico da vaca em combater